quinta-feira, 30 de junho de 2016

Introdução à Filosofia: A Filosofia do cuidado


 
Cuidar não é proteger, é cultivar
 
Quando protegemos afastamos algo perigoso - e assim nos precavemos por temor
 
Com o cuidado a situação é bem outra: nos precavemos por amor
 
Desde os gregos antigos a Filosofia pode ser entendida e cultivada como uma arte do cuidado
 
Cuidar do mundo, cuidar a sociedade, cuidar a si mesmo
 
O tempo, tomado como passagem (passado/presente/futuro)
exige que saibamos como organizar o mundo, a sociedade e também nossas emoções.
 
 
 
Como o tempo não para, ele pode estar a nosso favor ou contra nós.
 
Não é questão de dinheiro, ou questões estéticas, pois existe muitos ricos e pessoas belas que chegam a se suicidar de tamanha infelicidade.
 
Basta que olhemos os noticiários de hoje: uma ex-miss Brasil, depressiva e suicida...
 
A arte do cuidado, embora tenha sim o cuidado com a beleza, ela é muito mais...
 
Ocorre que destruímos nosso corpo pelos vícios e excessos. Assim como destruímos nossa mente pelos pensamentos estúpidos e pelos hábitos perniciosos
 
As dietas, cada vez mais insanas, são mostras claras de um desequilíbrio social. Qual o preço por sacrificarmos nossa saúde?
 
É claro que o perigo atrai. Radicalizar, surpreender, transgredir...Mas em toda transgressão, temos que calcular os riscos...
 
Vejamos o que o fazemos com o nosso corpo: todos os dias o limpamos, passamos perfumes, e de tempos em tempos cortamos os pelos e muitos até fazem procedimentos estéticos (vejam o que as mulheres gastam com isso!)
 
Comprar roupas, jóias e adornar, etc., toda essa ordenação do corpo, o culto do corpo, ele é deslocado, muitas vezes, do cuidado da mente
 
Descartes mostra com muita propriedade o quanto somos a mistura indiscernível de mente e corpo.
A alma humana não está no corpo como se este fosse um navio e ela um piloto, ao contrário!
 
Todo dano no corpo é um dano na alma, e vice-versa!
 
Desde os filósofos helenísticos gregos, como Epicuro, por exemplo, e boa parte da Filosofia Oriental, como o Budismo, estas mostram o quanto é equivocado dissociar o cuidado do corpo do cultivo da mente.
 
Cuidar do interior, fazer de si mesmo um experimento, esses são elementos importantes destas artes de trabalhar o nosso próprio ser para além da esfera estritamente estética.
 
Se o pacote da embalagem é fundamental, como todo bom marqueteiro sabe... seu conteúdo também o é! Como todo bom filósofo defende!
 
O ideal é que aparência e essência se complementem... Mas não é assim tão simples...
 
O real do que somos não deve ser  transgredido pelo exterior.
 
Michel de Montaigne mostra com muita propriedade o quanto somos escravos das convenções sociais. Dizia o filósofo que devemos criar um casulo, como ele fazia em seu castelo, e este lugar seria o espaço para que pratiquemos nossas experiências mais íntimas.
 
A metáfora do castelo é muito interessante. Em nossa mente devemos deixar espaços para que vivamos, pensemos e cultivemos experiências pessoais.
 
Família, emprego, convenções sociais, tudo isso deve ser administrado segundo limites, de tal modo que esse casulo, esse cantinho só nosso, seja a válvula de escape de uma existência que deve ser verdadeiramente vivida.
 
Viver para si mesmo - e quando tenhamos
 amor e amizade, que seja para edificar o castelo do nosso próprio ser.
 
Devemos selecionar quem adentra em nosso casulo...
 
O viver para si mesmo não é uma arte do egoísmo, ao contrário, em sua obra Ensaios o filósofo mostra que nossa experiência psicológica, de um eu que sempre está em construção, pois é inacabado, difuso e complexo, ele é mais bem sucedido quando encontra o outro.
 
Esta experiência com o amor e a amizade é justamente a ultrapassagem de uma esfera limitada para o alcance de algo que nos escapa, nos toca, nos seduz e traz felicidade.
 
A amizade verdadeira, dizia o filósofo francês, além de ser extremamente rara, ela é um dos maiores bens, pois nela ultrapassamos nosso eu (ego).
 
Podemos pensar tal situação como próxima do amor - amar não é gozar o outro, é gozar com...
 
É por isso que o estupro, por exemplo, não é apenas o uso do corpo de outrem, mas é uma transgressão radical e banal da própria humanidade.
 
O desrespeito à humanidade e à sociedade brasileira aparece claramente quando políticos que vivem às custas dos impostos da população chegam a fazer apologia ao estupro ou dizem que a culpa é da vítima...
 
Deixando de lado tais figuras bizarras da política brasileira atual,  todo amor deve ser relação/encontro -
 
É o "fazer junto".
 
Amor é cultivo da vida/encontro/gozo
 
Embora escrever assim seja simples, admitimos que a relação com o outro é sempre polêmica. Pois temos desejos e necessidades pessoais que colidem...
E não estamos bem sempre...Não são apenas as mulheres que têm TPM!
 
De todo modo, o equilíbrio, sempre ele, é a recomendação filosófica tradicional!
 
Quando o proteger é um cuidar, e mesmo um ciúme equilibrado, que é mais cuidado que ciúme, todos estes são elementos que, quando adequadamente administrados, eles esculpem a relação positivamente. 
 
Evidentemente, o contrário é prejudicial.
 
Já dizia Hipócrates em relação à Medicina: Faça que seus alimentos sejam seus remédios, e seus remédios seus alimentos!
 
É por isso que as brigas e separações são avassaladoras, pois mostram o abismo entre duas pessoas e a impossibilidade de manter o encontro.
 
O nosso eu, neste sentido, ele se realiza mais plenamente quando deixa de  viver apenas o si-mesmo e promove esta arte do encontro, do cuidado de si mesmo com um cuidado com o outro, o que chamamos em Filosofia de intersubjetividade.
 
 
A experiência desta intersubjetividade, do viver junto e do viver com é mais que uma necessidade ética, mas ela é também experiência estética.
 
O maravilhamento com o mundo, com o outro, neste processo de enfeitar nossas relações com as coisas, por estes processos somos capazes de edificar nossas emoções e experiências, atribuindo sentido e fazendo da vida algo prazeroso para além do puro prazer sensorial.
 
Tanto é melhor quando corpo e mente se cuidam e se confundem - É assim no amor e também no cuidado de si.



Autor: Edgard Vinícius Cacho Zanette
 
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