quarta-feira, 17 de maio de 2017

Introdução ao pensamento filosófico: A filosofia como campo de batalha





Nada mais atual que pensarmos o presente, em vista do passado que nos constitui.



Voltemos, pois, a tratarmos da atitude filosófica, para então pensarmos a filosofia em nosso presente.


Geralmente se busca ensinar a atitude filosófica a partir do significado da palavra “filosofia”.


Segundo uma perspectiva tradicional, por volta do século VI ac., de maneira formidável, certos sábios e pensadores gregos ganham o status de “amigos do saber”.



As virtudes do filósofo, assim como a natureza do filosofar, ambas perpetuariam um projeto irrevogável imanente à racionalidade.



A racionalidade se distanciaria da sedução e persuasão próprias à arte de ensinar dos sofistas.



Os processos lógicos, a ligação com um pretenso saber que se perceberia como mais relevante que o mito e a religião, e outras conhecidas especulações, visam justificar a eminência do filosofar como produto de um milagre na história que explicita um universal desejo de verdade.



Aristóteles explicando o papel da “sophia” (sabedoria)




Pensemos, em primeiro lugar, que o sábio sabe tudo, na medida do possível, sem ter a ciência de cada coisa em particular. [...] Ademais, àquele que conhece com mais exatidão e é mais capaz de ensinar causas, consideramo-lo mais sábio em qualquer ciência. E, entre as ciências, pensamos que é mais sabedoria a que é desejável por si mesma e por amor ao saber, do que aquela que se procura por causa dos resultados, e que aquela destinada a mandar é mais sabedoria que a subordinada. Pois não deve o sábio receber ordens, porém dá-las, e não é ele que há de obedecer a outro, porém deve obedecer a ele o menos sábio. (ARISTÓTELES, Metafísica, A 982 a).


O filósofo não deveria filosofar sobre o sentir, pois os sentidos "são fáceis" e universais.


Esta tese não é inovadora, remontando às origens da filosofia, visto que Parmênides em seu poema "Da Natureza" já havia lançado uma guerra com vistas a desvincular a via da verdade, da lógica e do pensar, da via da opinião, dos sentidos, do erro e da ilusão.


Não que Aristóteles menospreze os sentidos, ao contrário, o estagirita era um empirista e realista. No entanto, ele considera que há uma Filosofia Primeira que supera a natureza do sentir, visto que se a todos é permitido o acesso à satisfação produzida pelas sensações, mas o sábio é o único que estuda a ciência das causas e princípios.


Dominando as causas e não amando a sabedoria por seus resultados, a sabedoria do sábio é o que lhe garante um posto privilegiado de ser aquele que dá ordens em vez de recebê-las.



Seguindo a análise da passagem acima da Metafísica de Aristóteles, o saber filosófico ser caracterizaria por:



1) remeter a totalidade e abarcar a universalidade;


2) ser um saber livre e desinteressado;


3) manifestamente procuraria dominar as causas, pois não se contentaria com aparências e contradições, mas envolveria uma atitude crítica.




Esta atitude crítica chamada de [thauma] “admiração”, “assombro” ou “espanto”, seria um puro e desinteressado desejo de saber. Vejamos outra passagem da Metafísica de Aristóteles que explicita o aspecto crítico do filosofar:



Com efeito, foi pela admiração [thauma] que os homens começaram a filosofar tanto no princípio como agora. [...] E o homem que é tomado de perplexidade e admiração julga-se ignorante (por isso o amigo dos mitos [filómito] é de certo modo filósofo, pois também o mito é tecido de maravilhas); portanto, como filosofavam para fugir à ignorância, é evidente que buscavam ciência a fim de saber, e não com uma finalidade utilitária. (ARISTÓTELES, Metafísica, A 982 b).


A Filosofia como tradutora de sentido e como campo de batalha



A Filosofia não está em todas as configurações históricas e seu modo de ser é a descontinuidade.


No entanto, há um sentido fundamental da Filosofia, hoje, que não está pautado em considerá-la tão somente como a “ciência do ser enquanto ser” ou como a mãe de todas as ciências.



Condições da Filosofia 
Alain Badiou


● Os procedimentos genéricos, a partir dos quais é possível “acontecer” verdades, são:


● 1) Ciência (matemática);


● 2) Artístico (Poema);


● 3) Político;


● 4) O amor


Duas condições do Filosofar atual



A Filosofia manifesta um caráter de “traduzir” o acontecer de certos processos que já constituem em si mesmos pensamentos.



O caráter argumentativo e interpretativo do filosofar se liga a um outro não menos importante, o qual manifesta combates ideológicos nos acontecimentos históricos do devir humano.



Da necessidade para a possibilidade do filosofar



Estes acontecimentos podem ser ou manifestar procedimentos de verdade ou não, mas o pensar que os acompanha pode contribuir de forma iluminadora.




A Filosofia não pode ser obtusa ao ponto de negar contribuir, pensar e iluminar certas atrocidades históricas que acontecem no desvelar do fluir histórico-social.


Pensar junto com...o acontecer


Situação Filosófica



● “[...] impõe a existência de uma relação entre termos que, em geral, ou para o opinião estabelecida, não podem ter relação. Uma situação filosófica é um encontro. Um encontro entre dois termos essencialmente estranhos, um a respeito do outro”.



● (BADIOU, Circunstances 2 – Filosofia del presente, p. VII)


Encontro heterogêneo: 
Oposição entre saber e Poder


● Caso Sócrates X Cálicles no diálogo Górgias de Platão


● (BADIOU, Circunstances 2 – Filosofia del presente, p. VII).


● Equipolência no campo argumentativo-interpretativo:


● entre justiça e injustiça há que haver uma medida comum que supere a incomensurabilidade entre dois âmbitos discursivos no embate ideológico?



A verdadeira vida está presente!



● Contra o pessimismo do “Pós Segunda Guerra Mundial”, Alain Badiou sugere algumas tarefas da Filosofia em relação as situações filosóficas:






● 1) Iluminar as eleições fundamentais do pensamento.


● 2) Iluminar a distância entre o pensamento e o poder, a distância entre o Estado e as Verdades.


● 3) Iluminar o valor da exceção, das rupturas que incidem sobre o conservadorismo social.

● Grandes tarefas da Filosofia: deve tratar da eleição, da distância e da exceção. Ao menos a partir do momento em que a Filosofia é algo que tem importância na vida, resultando ser mais que uma disciplina acadêmica.


(BADIOU, Circunstances 2 – Filosofia del presente, p. XI-XII)


Referências Bibliográficas:


● ARISTÓTELES. Ética a Nicômacos. Tradução: Mário da Gama kury. Brasília: Ed Universidade de Brasília, 4* edição, 2001.


● ________________. Política. Tradução: Torrieri Guimarães. São Paulo: Martin Claret, 2002.


● ________________. Metafísica, livros IV e VI. Tradução e notas: Lucas Angioni. Campinas: Unicamp, 2* edição, 2003.


● BADIOU, Alain. Filosofía del presente. Tradução: Alejandrina Falcón. Caracas, Venezuela: Monte Ávila Editores, 2009.


● ________________. L’Être et l’Événement. Paris: Seuil, 1988.


● ________________. Manifeste pour la Philosophie. Paris: Seuil, 1989.


● ________________. Éloge de l’Amour (Com Nicholas Truong). Paris: Flammarion, 2009.


● ________________. La Philosophie et L´Événement (com Fabien Tarby). Germina, Paris, 2010.